15 novembro 2006

O drama dos atrasos aéreos

Examinando, mesmo superficialmente, o problema dos aeroportos brasileiros nos últimos dias com literalmente milhares de atrasos dos vôos programados, o que gerou o cancelamento de dezenas deles, percebe-se que a culpa pelo transtorno causado aos passageiros é, de fato, dos controladores de vôo que operam o sistema de controle de trafego aéreo. Aliás, nenhuma novidade nisso.
Esse importante sistema é operado por profissionais lotados em departamentos administrados pela Aeronáutica brasileira, vale dizer, são diretamente ligados à União Federal.
Esses atrasos causaram e ainda causam danos de várias espécies (materiais e morais) não só aos consumidores-passageiros, mas também à companhias aéreas, eis que os atrasos e cancelamentos implicam gastos extras e receitas menores. E, tendo em vista que o centro do problema está nas mãos da Aeronáutica, não resta dúvida de que a responsabilidade última pelos danos causados a todos (consumidores e empresas aéreas) é da União Federal.
Responsabilidade última, disse, e não responsabilidade direta diante dos consumidores. Esta é das companhias aéreas que, diga-se desde logo, não tem como se escusar em indenizar os passageiros lesados. Isso porque o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, aplicável ao caso, não prevê essa excludente.
A norma regula a responsabilidade civil objetiva do prestador do serviço, isto é, o transportador é responsável por reparar os danos causados aos consumidores, independentemente da existência de culpa. Ou, em outros termos, é irrelevante o fato de existir ou não culpa da companhia aérea, pois ela sempre responde. Claro que, depois de indenizar os consumidores, a empresa aérea pode, pela via de regresso, acionar a União para se ressarcir daquilo que pagou (como pode também pleitear indenização pelos danos que diretamente sofreu, como acima afirmado).
Anote-se que a exceção prevista no inciso II do §3º do art. 14 referido não incide na espécie, pois a excludente lá prevista fala em culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. Que o passageiro-consumidor não tem qualquer culpa no evento danoso é induvidoso. E o terceiro de que fala a lei é aquele que não participa da relação jurídica de consumo, aquele que não tem conexão com o produto oferecido ou com o serviço prestado. Ora, os serviços oferecidos pelas empresas aéreas tem relação direta com os controladores de vôos e com a Aeronáutica, aliás, dependem deles. O sistema de controle de tráfego, o funcionamento dos aeroportos, dos embarques e desembarques etc fazem parte do risco típico da atividade das empresas aéreas. Por fim, inclusive, lembre-se que atrasos são comuns, assim como o pagamento de indenizações. A única diferença nesse episódio é a concentração dos atrasos em alguns dias e o enorme número deles.

31 outubro 2006

OS JUROS MORA NO DIREITO DO CONSUMIDOR – 30-10-06

Com a entrada em vigor do novo Código Civil(CC) em 12-01-2003, surgiu um problema de interpretação inexistente na vigência do Código Civil de 1916, em relação aos juros de mora. O que era incontroverso, infelizmente, tornou-se polêmico por conta da redação dos arts. 406 do novo diploma legal.
No blog postado hoje, vou apresentar sucintamente um panorama do que penso ser correto nesse tema. Para uma análise mais pormenorizada veja o artigo que publico também hoje no site.
Os problemas de interpretação das novas regras do CC iniciam-se na redação do art. 406. Segundo esta, os juros de mora são aqueles mesmos vigentes para o caso de cobrança dos juros de mora devidos à Fazenda Nacional.
Anote-se bem: o art. 406 do NCC refere taxa de juros de mora devidos à Fazenda Nacional e não correção monetária do valor devido.
Ora, o que são e para que servem os juros? Os juros ou remuneram o capital, por exemplo em função de um empréstimo de dinheiro(mútuo), ou fazem o devedor remunerá-lo em decorrência do atraso no pagamento. Juros de mora são aqueles que remuneram o atraso; os que são cobrados do inadimplente.
Os juros não se confundem com correção monetária, que tem como função buscar corrigir o valor da moeda, corroída pela inflação, no intuito de manter seu poder aquisitivo inalterado. No Sistema Tributário Nacional, a norma que manda pagar juros de mora por inadimplência relativa a tributos é a do art. 161 e § 1º, do Código Tributário Nacional.
Essa norma tem plena vigência com aplicação a todo e qualquer tributo. Desse modo, fazendo um raciocínio lógico, tem-se que o art. 406, do CC, remete diretamente ao art. 161 e § 1º, do CTN, que regula os juros de mora. Por isso que eles são de 1% ao mês. Concluo, pois, que os juros de mora em qualquer relação jurídica (o que inclui as de consumo) não podem ser superiores a 1% a.m.
Anote-se, por fim, uma peculiaridade. Há centenas, senão milhares de ações judiciais em andamento, que se iniciaram na vigência do CC de 1916 e continuam ainda na vigência do novo CC, o que impõe uma decisão sobre a incidência ou não do novo diploma legal. Penso que, a aplicação é simples: 0,5% ao mês calculado até 11-01-2003 e, a partir de 12-01-2003, 1% ao mês. Claro que, para os casos em que por expressa previsão contratual os juros de mora haviam sido estipulados em 1% ao mês, não há qualquer alteração. O Tribunal de Justiça de São Paulo já vem aplicando juros de mora na vigência do novo CC pela taxa de 1% ao mês, assim como tem mandado calcular os juros de mora nos moldes acima, para os casos iniciados antes de sua vigência e que ainda estão em curso. Veja decisões que publico hoje no site.

19 outubro 2006

Os serviços de energia elétrica: história de abuso

Ontem dei uma palestra e na saída um aluno bastante indignado me contou a seguinte história.
Há alguns meses recebeu oferta para colocar suas contas pessoais em débito automático, o que ele fez, incluindo as contas caseiras (gás, energia elétrica, telefone) e o cartão de crédito. Tudo bem, muito prático e ele continuou sua normal vida de consumidor.
Na semana passada, ele, síndico do prédio onde mora, foi chamado pelo porteiro, eis que estavam à porta dois funcionários da companhia distribuidora de energia elétrica que compareciam para cortar o fornecimento de um apartamento. Ele pediu para os funcionários subirem ao apartamento e os recebe. Para seu espanto o apartamento indicado para o corte era o dele!
Como os dois funcionários lá estavam, ele os levou até seu computador pessoal, abriu a tela do banco e – violando-se em sua privacidade – mostrou aos dois que as contas haviam sido pagas. Eles disseram: "Isso é problema seu com o banco. Temos ordem para cortar e se o banco falhou, reclame com ele". O aluno, então, assustado, pois não podia ficar sem energia elétrica, já que perderia os do produtos freezer, da geladeira, e não poderia trabalhar etc (alguém pode ficar sem energia elétrica?), decidiu entrar no site da companhia, imprimiu segundas vias das contas e, na frente dos funcionários, via internet, quitou as parcelas novamente. Mas, de nada adiantou, pois o corte foi feito.

Bem, saiba você leitor, que não há nenhum novidade nisso. O que chama atenção é a arrogância, o abuso e a intolerância da companhia representada por seus funcionários. Diante de uma conta paga e de outra paga novamente na frente do funcionário, pelo sistema instituído pelo parceiro do prestador de serviço, o banco, o executor cria o dano sem qualquer fundamento. Abaixo falou um pouco da ilegalidade do corte, mas o que é impressionante no episódio é o fato de que não se tratava de cobrança de dívida ou não entrega do serviço ao inadimplente, mas pura e tão somente vingança e maldade: o dano pelo dano.
A ilegalidade do corte está bem colocada em várias decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo. Cito como exemplo as duas que coloquei nas últimas notícias do site. Uma delas trata de corte por simples inadimplência e a outra cuida de corte por cobrança de dívida pretérita imputada ao consumidor.

Lembro que mesmo para aqueles que aceitam o corte por inadimplemento, que as companhias não têm mais mandado os avisos prévios; têm inserido o texto nas próprias contas-faturas de energia, o que, por vezes, passa despercebido pelo consumidor e, claro, passa mais despercebido ainda quando o consumidor se utiliza dos débitos automáticos.

12 outubro 2006

O direito dos familiares das vítimas desaparecidas ou não identificadas

Continuo aqui repercutindo o problema dos acidentes aéreos de grandes proporções. Tenho lido o noticiário e percebi que ainda não se tratou do direito dos familiares das vítimas cujos corpos não foram localizados ou não puderem ser identificados.
Primeiramente, lembro que esses familiares devem ser cautelosos na guarda dos documentos primários que assegurem que a pessoa estava no vôo sinistrado, eis que precisarão obter o atestado de óbito pela via judicial. As listas de passageiros divulgadas pela Cia Aérea, a cópia do ticket ou passagem emitida pela agência de turismo, além do material publicado na imprensa são elementos de prova e devem ser por eles guardados.
Quanto à solução jurídica, ela está na Lei de Registros Públicos (Lei 6015/73), cujo artigo 88 regula o procedimento judicial de justificação para o assento de óbito de pessoas desaparecidas em naufrágios, inundações, incêndios, terremotos ou quaisquer outras catástrofes, dentre as quais, pensamos, enquadra-se a queda de aeronaves. O atestado de óbito é documento essencial para o eventual ajuizamento de ação.
Chamou-me também atenção o fato de que, no caso do acidente do vôo 1907, a imprensa em geral estar cada vez mais tratando da responsabilidade civil dos proprietários do outro avião. Tudo bem. Uma vez provada a culpa dos condutores daquela outra aeronave, o proprietário é também responsável pelos danos ocorridos. Todavia, é importante realçar -- aliás, como já expliquei no blog do dia 04-10-2006 -- que a responsabilidade do transportador é objetiva, decorrente do risco de sua atividade e a legislação -- tanto o Código de Defesa do Consumidor como o Código Civil -- são claros em garantir o direito aos familiares dos vítimas. Se a opção for por acionar o dono do outro avião, haverá necessidade de prova da culpa, no que não vislumbro -- pelo menos, pelos elementos por ora analisados -- qualquer vantagem processual.

04 outubro 2006

Aviões se chocam no ar: qual companhia responde pelos danos?

Por causa da queda do avião da Gol e pelo modo como, tudo indica, aconteceu, tem-se colocado a questão: e se o acidente se deu por culpa do jatinho? Não seria ele o “terceiro” causador do dano e por isso o responsável pelas perdas?
Para responder a questão, é necessário primeiro lembrar que a responsabilidade civil estabelecida no Código de Defesa do Consumidor é objetiva e fundada na teoria do risco do negócio, vale dizer, é o risco da atividade que garante a responsabilidade do fornecedor. E para se conhecer a extensão do risco é preciso fazer uma análise do próprio negócio. Tem-se que perguntar se o acidente era previsível dentro do campo de atividade explorada.
No caso de transporte aéreo, parece claro que choque de aeronaves – apesar da raridade do evento – é tranqüilamente previsível, isto é, pode sim ocorrer. As chamadas vias aéreas são repletas de aviões que, inclusive, nas rotas não ficam assim tão distantes um dos outros. Por exemplo, nas rotas de idas e vindas a distância de altitude entre a aeronave que vai e a que vem pela mesma rota é de apenas 1.000 pés (fio-me nas informações fornecidas pelos engenheiros controladores do trafego). E as torres de controle, tendo em vista a alta complexidade do trafego, tem papel fundamental no funcionamento desse verdadeiro trânsito dos céus.
Ora, faz parte do cálculo do risco desse tipo de atividade não só o choque de aeronaves, como o choque com pássaros, balões, o atingimento por raios, a queda por mudança atmosférica imprevista, assim como a quebra e o não funcionamento de equipamentos fundamentais ao funcionamento do veículo etc. Logo, ainda que, eventualmente, a queda da aeronave se dê por culpa de outra aeronave ou por choque ocasionado por erro dos operadores das torres de controle, não resta dúvida que a empresa transportadora responde civilmente pelo dano, pois é responsabilidade objetiva decorrente do risco de sua atividade. Esse “terceiro” que causou o acidente não é o terceiro de que fala a lei para excluir a responsabilidade do transportador. O mesmo se dá, por exemplo, no extravio de bagagem no transporte aéreo. Normalmente, é um “terceiro” que rouba ou furta a bagagem, mas ainda assim, não se discute a responsabilidade civil e objetiva do transportador, pois é caso típico de risco de sua atividade.
E só para terminar: o terceiro que a lei refere é aquele que não participa da relação jurídica de consumo, aquele que não tem conexão com o produto oferecido ou com o serviço prestado. Raios, aeronaves, tempestades e equipamentos não são nem eventos imprevistos nem terceiros fora do risco da atividade. Veja-se nesse sentido, na análise do risco da atividade do transportador aéreo e a relação com o terceiro, nossa decisão do agravo de instrumento 836.448-9 publicado no site.

02 outubro 2006

O direito dos familiares das vítimas em acidentes aéreos

Agora que, infelizmente, estamos vivenciando mais um desastre aéreo, é necessário, desde logo, esclarecer-se as principais questões jurídicas, no que envolve o direito da família das vítimas que estavam no vôo 1907 da Gol.
Listo, alguns itens fundamentais:
A lei aplicável à espécie é o Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90);
O prazo para pleitear indenização por danos materiais (emergentes e lucros cessantes) e danos morais é de cinco anos (art. 27, CDC). Como existe uma discussão a cerca do prazo, em que se discute se não seria de dois anos, então, o que se aconselha é que as medidas judiciais sejam tomadas antes dos dois anos, tempo, aliás, suficiente;
A responsabilidade civil direta e imediata é da Cia Aérea, cuja responsabilidade objetiva está retratada no art. 14 do CDC. Não importa o motivo da queda, eis que o caso é típico de risco da atividade empresarial. Nesse sentido, veja-se as decisões judiciais que publico no site www.acasadodireito.com.br
É possível fazer-se transação amigável com a Cia Aérea. Mas, vale um conselho: sempre, em qualquer hipótese, a família deve estar acompanhada de advogado de confiança;
É importante guardar documentos tais como reportagens de jornais e revistas, cópia da listas de passageiros publicadas pela Cia Aérea, eventual cópia to ticket-passagem ou bilhete de passagem tudo a evitar que, no futuro, se alegue que a vítima não estava no fatídico vôo;
Os familiares que são dependentes da pessoa falecida têm direito a uma pensão, que será calculada de acordo com os proventos que ela tinha em vida;
No cômputo dos danos materiais inclui-se tudo relacionado ao evento, desde despesas com locomoção e alimentação do familiar que teve de cuidar da difícil tarefa de reconhecer o corpo e fazer seu traslado, como despesas com o funeral;
Os danos morais serão fixados pelo Juiz no processo. Para ter uma idéia dos valores geralmente adotados, consulte-se o site www.acasadodireito.com.br
A Cia Aérea tem o dever de dar toda assistência às famílias das vítimas, inclusive propondo o pagamento de indenizações e pensões. Essa conduta, uma vez realmente adotada, numa eventual ação judicial para a fixação do dano moral, será levada em conta pelo magistrado que, então, amenizará o ponto ligado ao aspecto punitivo;
Repito para que as vítimas possam se precaver: esse é um caso que exige a prévia contratação de advogado de confiança para atuar em todas as fases.

08 junho 2006

O Princípio Constitucional da Dignidade da Pessoa Humana - Doutrina e Jurisprudência


Com base no pensamento humanista e científico de Einstein, este livro traz nova formulação da idéia de princípio, como algo absoluto e imutável. Partindo desse pressuposto, o autor revela que a dignidade da pessoa humana, como princípio universal que é, deve sempre descer do trono mais alto que está colocada para vir a tornar-se eficaz na realidade concreta, jurídica e social. Em busca dessa eficácia, junto com a discussão conceitual, traz esta obra decisões judiciais fundadas nesse princípio, argumentando o autor que toda decisão judicial deve sempre aplicá-lo concretamente, como meio de fazer Justiça, meta necessária de qualquer Magistrado. Além disso, e visando imprimir caráter prático à obra, o autor apresenta conexões do princípio da dignidade com o chamado princípio da proporcionalidade, para sugerir caminhos que levem ao fazimento da Justiça. O presente trabalho é indicado não só aos profissionais e estudantes de Direito, mas também aos de Filosofia, Política, Ciências e Sociologia.

06 junho 2006

Curso De Direito Do Consumidor

Sinopse

Este inédito estudo vem a lume trazendo a sistematização das normas e princípios consumeristas. Os primeiros itens desenvolvem o escorço histórico do direito do consumidor e abordam os princípios constitucionais de proteção ao consumidor. Em seguida são conceituados institutos essenciais como relação de consumo, consumidor e fornecedor, produto e serviço e outros. Adiante, examinam-se os direitos básicos do consumidor e os princípios contidos no CDC. A obra envereda, então, pelo tema da responsabilidade civil objetiva, oportunidade em que se apresenta um amplo estudo sobre vício e fato do produto ou do serviço, prescrição, responsabilidade dos profissionais liberais, garantia legal e contratual e outras questões. São, ainda, desvendadas as implicações da publicidade e da oferta, da proteção contratual, das práticas abusivas e da desconsideração da personalidade jurídica e os aspectos processuais da defesa dos direitos do consumidor. Ao longo de toda a obra, são analisados casos concretos, com fulcro na jurisprudência recente, que ajudam na compreensão dos temas.