Uma das questões de ordem jurídica das mais relevantes no caso da queda do avião da Air France está relacionada a dificuldade de se encontrar os corpos das vítimas, o que trará uma série de transtornos a seus familiares.
Pergunto, pois, para responder: como obter certidão de óbito das pessoas que estavam no vôo AF 447, cujos corpos não sejam encontrados ou não possam ser identificados? O que devem fazer os familiares?
Respondo a seguir.
Legislação brasileira resolve
São dois os dispositivos que importam no caso. O artigo 88 da Lei de Registros Públicos (Lei 6015 de 1973) combinado com o artigo 7º do novo Código Civil (que entrou em vigor em 11-01-2003).
O primeiro dispõe que será feito o procedimento de justificação judicial para o registro do óbito das “pessoas desaparecidas em naufrágio, inundação, incêndio, terremoto ou qualquer outra catástrofe, quando estiver provada a sua presença no local do desastre e não for possível encontrar-se o cadáver para exame”. Logicamente, a queda de aeronaves enquadra-se na hipótese legal.
Por sua vez, o artigo 7º do Código Civil cuida da morte presumida dizendo que ela pode ser declarada “se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida” (inciso I). Diz também que a declaração da morte presumida “somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações”, cabendo ao Juiz “fixar a data provável do falecimento”(parágrafo único).
Procedimento judicial
Portanto, após esgotadas as buscas dos destroços do avião AirBus e dos corpos das vítimas, sem que estas tenham sido encontradas ou, uma vez encontradas, não puderem ser identificadas, os familiares poderão dar início ao procedimento judicial para obtenção do atestado de óbito.
Nessa ação judicial, o Juiz, depois de apurar as provas, determinará a expedição do competente atestado de óbito. Esse documento é essencial para o eventual ajuizamento da outra ação visando receber indenização por danos materiais, inclusive pensão alimentícia, e danos morais.
Documentos a serem guardados
Lembro que os familiares devem ser cautelosos na guarda dos documentos que assegurem que a pessoa estava no vôo sinistrado, para servir de prova no procedimento judicial. As listas de passageiros divulgadas pela companhia aérea e também pelos órgãos de investigação, a cópia da passagem aérea emitida pela agência de turismo, ou do e-ticket enviado por e-mail, a confirmação da reserva, o nome e endereço de testemunhas que tenham levado à pessoa ao aeroporto etc são elementos de prova e devem ser por eles guardados e anotados. O material publicado na imprensa e que apresente o nome do familiar também pode ser utilizado.
A responsabilidade da companhia aérea
Independentemente dos motivos que causaram a queda do avião, a responsabilidade pelos danos causados às vítimas e familiares é do transportador. É o que se chama responsabilidade objetiva pelo risco que sua atividade gera aos consumidores e à sociedade em geral. É o risco integral do negócio ou atividade econômica.
O Código de Defesa do Consumidor, aplicável ao caso, fala em responsabilidade pelo fato do produto e do serviço. Isto é, a norma, dentro do regramento da responsabilidade objetiva, é dirigida ao próprio acidente: é o fato do produto e do serviço causadores do dano o que importa.
A responsabilidade objetiva: não se apura culpa
Não há necessidade de apuração da culpa. É que, como adiantado acima, a responsabilidade objetiva tem relação direta com o risco da atividade empresarial. O empreendedor tem o direito de estabelecer-se com seu negócio (no caso, o transporte aéreo) explorando o mercado de consumo. Essa exploração lhe dá o direito ao sucesso, quando afere lucros, mas também ao fracasso, suportando perdas. O cálculo que ele faz em relação à exploração de sua atividade, é um cálculo voltado a prevenir os riscos de seu negócio para maximizar os lucros e diminuir as perdas.
Em toda atividade as perdas são inevitáveis. Além disso, a própria exploração da atividade gera risco social, independentemente da vontade do empreendedor. Juridicamente, a culpa está ligada ao elemento subjetivo da vontade do agente e sua ação conseqüente (negligência, imprudência ou imperícia).
Ora, é por demais evidente que, quando cai um avião, o terrível evento não se dá por vontade do transportador; do mesmo modo que quando o freio de um automóvel falha, isso não representa a vontade da montadora; nem quando um aparelho de ar condicionado se incendeia, tal fato não decorre da vontade do fabricante etc.
A lei sabe disso. Ela sabe que, apesar da vontade do fabricante, prestador do serviço etc, e por mais que ele se esforce, algum produto quebrará ou serviço falhará causando danos ao consumidor. E é por isso que ela estabeleceu a responsabilidade objetiva. É responsabilidade que decorre da mera circunstância de existir o empreendimento e está ligada ao risco de sua atividade. Como o fornecedor recebe o preço pelo produto ou serviço colocado no mercado (com ou sem defeito), é a receita daí advinda que responde pelos danos.
Portanto, no acaso do acidente aéreo, não há que se falar em apuração de culpa. Não importa de quem seja: se da falha do equipamento do avião que não funcionou, da falta de manutenção, de erro dos pilotos etc ou mesmo por causa de problemas climáticos. Para mandar a companhia aérea indenizar as vítimas e seus familiares não há necessidade dessa apuração. É, repito, responsabilidade direta decorrente do risco de sua atividade.
Claro que, a companhia aérea poderá, após pagar a indenização, buscar se ressarcir do responsável último pelo evento danoso, momento em que terá de provar a culpa do causador, mas isso não afeta o direito das vítimas e seus familiares.
Nexo de causalidade
A responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre: a) o consumidor lesado (a vítima e seus familiares); b) o produto e/ou o serviço; c) o dano efetivamente ocorrido.
No caso do acidente aéreo, os familiares: a) devem demonstrar que a vítima estava no avião; b) devem mostrar o grau de relação com a vítima e a dependência econômico-financeira que existia; c) devem juntar comprovantes dos rendimentos recebidos pela vítima; d) devem apresentar os gastos realizados etc.
Por fim lembro que, esse é o tipo de questão que deve ser acompanhado de perto por advogado de confiança dos familiares.
Pergunto, pois, para responder: como obter certidão de óbito das pessoas que estavam no vôo AF 447, cujos corpos não sejam encontrados ou não possam ser identificados? O que devem fazer os familiares?
Respondo a seguir.
Legislação brasileira resolve
São dois os dispositivos que importam no caso. O artigo 88 da Lei de Registros Públicos (Lei 6015 de 1973) combinado com o artigo 7º do novo Código Civil (que entrou em vigor em 11-01-2003).
O primeiro dispõe que será feito o procedimento de justificação judicial para o registro do óbito das “pessoas desaparecidas em naufrágio, inundação, incêndio, terremoto ou qualquer outra catástrofe, quando estiver provada a sua presença no local do desastre e não for possível encontrar-se o cadáver para exame”. Logicamente, a queda de aeronaves enquadra-se na hipótese legal.
Por sua vez, o artigo 7º do Código Civil cuida da morte presumida dizendo que ela pode ser declarada “se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida” (inciso I). Diz também que a declaração da morte presumida “somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações”, cabendo ao Juiz “fixar a data provável do falecimento”(parágrafo único).
Procedimento judicial
Portanto, após esgotadas as buscas dos destroços do avião AirBus e dos corpos das vítimas, sem que estas tenham sido encontradas ou, uma vez encontradas, não puderem ser identificadas, os familiares poderão dar início ao procedimento judicial para obtenção do atestado de óbito.
Nessa ação judicial, o Juiz, depois de apurar as provas, determinará a expedição do competente atestado de óbito. Esse documento é essencial para o eventual ajuizamento da outra ação visando receber indenização por danos materiais, inclusive pensão alimentícia, e danos morais.
Documentos a serem guardados
Lembro que os familiares devem ser cautelosos na guarda dos documentos que assegurem que a pessoa estava no vôo sinistrado, para servir de prova no procedimento judicial. As listas de passageiros divulgadas pela companhia aérea e também pelos órgãos de investigação, a cópia da passagem aérea emitida pela agência de turismo, ou do e-ticket enviado por e-mail, a confirmação da reserva, o nome e endereço de testemunhas que tenham levado à pessoa ao aeroporto etc são elementos de prova e devem ser por eles guardados e anotados. O material publicado na imprensa e que apresente o nome do familiar também pode ser utilizado.
A responsabilidade da companhia aérea
Independentemente dos motivos que causaram a queda do avião, a responsabilidade pelos danos causados às vítimas e familiares é do transportador. É o que se chama responsabilidade objetiva pelo risco que sua atividade gera aos consumidores e à sociedade em geral. É o risco integral do negócio ou atividade econômica.
O Código de Defesa do Consumidor, aplicável ao caso, fala em responsabilidade pelo fato do produto e do serviço. Isto é, a norma, dentro do regramento da responsabilidade objetiva, é dirigida ao próprio acidente: é o fato do produto e do serviço causadores do dano o que importa.
A responsabilidade objetiva: não se apura culpa
Não há necessidade de apuração da culpa. É que, como adiantado acima, a responsabilidade objetiva tem relação direta com o risco da atividade empresarial. O empreendedor tem o direito de estabelecer-se com seu negócio (no caso, o transporte aéreo) explorando o mercado de consumo. Essa exploração lhe dá o direito ao sucesso, quando afere lucros, mas também ao fracasso, suportando perdas. O cálculo que ele faz em relação à exploração de sua atividade, é um cálculo voltado a prevenir os riscos de seu negócio para maximizar os lucros e diminuir as perdas.
Em toda atividade as perdas são inevitáveis. Além disso, a própria exploração da atividade gera risco social, independentemente da vontade do empreendedor. Juridicamente, a culpa está ligada ao elemento subjetivo da vontade do agente e sua ação conseqüente (negligência, imprudência ou imperícia).
Ora, é por demais evidente que, quando cai um avião, o terrível evento não se dá por vontade do transportador; do mesmo modo que quando o freio de um automóvel falha, isso não representa a vontade da montadora; nem quando um aparelho de ar condicionado se incendeia, tal fato não decorre da vontade do fabricante etc.
A lei sabe disso. Ela sabe que, apesar da vontade do fabricante, prestador do serviço etc, e por mais que ele se esforce, algum produto quebrará ou serviço falhará causando danos ao consumidor. E é por isso que ela estabeleceu a responsabilidade objetiva. É responsabilidade que decorre da mera circunstância de existir o empreendimento e está ligada ao risco de sua atividade. Como o fornecedor recebe o preço pelo produto ou serviço colocado no mercado (com ou sem defeito), é a receita daí advinda que responde pelos danos.
Portanto, no acaso do acidente aéreo, não há que se falar em apuração de culpa. Não importa de quem seja: se da falha do equipamento do avião que não funcionou, da falta de manutenção, de erro dos pilotos etc ou mesmo por causa de problemas climáticos. Para mandar a companhia aérea indenizar as vítimas e seus familiares não há necessidade dessa apuração. É, repito, responsabilidade direta decorrente do risco de sua atividade.
Claro que, a companhia aérea poderá, após pagar a indenização, buscar se ressarcir do responsável último pelo evento danoso, momento em que terá de provar a culpa do causador, mas isso não afeta o direito das vítimas e seus familiares.
Nexo de causalidade
A responsabilidade de indenizar nasce do nexo de causalidade existente entre: a) o consumidor lesado (a vítima e seus familiares); b) o produto e/ou o serviço; c) o dano efetivamente ocorrido.
No caso do acidente aéreo, os familiares: a) devem demonstrar que a vítima estava no avião; b) devem mostrar o grau de relação com a vítima e a dependência econômico-financeira que existia; c) devem juntar comprovantes dos rendimentos recebidos pela vítima; d) devem apresentar os gastos realizados etc.
Por fim lembro que, esse é o tipo de questão que deve ser acompanhado de perto por advogado de confiança dos familiares.
2 comentários:
É o primeiro artigo que leio sobre questões práticas para auxiliar as famílias nesse momento tão doloroso...
Parabéns Professor, como sempre: objetivo e relevante.
Abs. Sua aluna, Sabrina.
parabens,estava procurando algo sobre sinstros aéreos,e esse é bem legal,pq?o www.beabadoconsumidor.com.br está fora. outro dia estava lendo,DIREITO DAS FAMILIAS DE VITIMAS EM ACIDENTE AÉREO.valeu MERMO meu irmão...(apenas um internauta)
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