23 julho 2007

O direito dos familiares das vítimas em acidentes aéreos.

Parece história sem fim, infelizmente: outro desastre aéreo de proporções catastróficas e já se especula sobre responsabilidades e direitos. Por isso, traço a seguir os principais temas que envolvem a questão de acordo com as normas vigentes no Brasil.

· Legislação aplicável
É quase estranho afirmar, mas nesse assunto temos no país leis de sobra. É que incide na hipótese do transporte aéreo o Código de Defesa do Consumidor(CDC) e o novo Código Civil(CC), além do Código Brasileiro de Aeronáutica(CBA). E, apesar, de existir certo debate sobre como e qual norma aplicar em algumas situações, em matéria de acidente aéreo tem-se entendido que não incidem os limites do CBA. É que nessa parte o CDC revogou o CBA tornando ilimitada a verba indenizatória. Além disso, não há qualquer dúvida de que a responsabilidade da companhia aérea é objetiva (ver abaixo), no que são compatíveis o CDC e o CC.

· Prazo para ingresso da ação judicial
Uma dúvida passível de debate é a que envolve o prazo de prescrição, isto é, o tempo que têm os familiares das vítimas para o ingresso da ação judicial. O CBA fala em 2 anos, O CC em 3 anos e o CDC em 5 anos. Penso que o prazo é de 5 anos, pois aplicável ao caso o CDC. Há decisões judiciais nesse sentido. No entanto, a disputa existe, inclusive, no Poder Judiciário. Assim, para evitar a discussão, basta que os familiares das vítimas ingressem com a ação judicial no prazo de 2 anos a contar da data do acidente.


· Responsabilidade civil
A responsabilidade civil da transportadora é objetiva, isto é, independe da apuração da culpa de quem quer que seja. Os familiares não precisam aguardar o resultado de nenhum tipo de investigação, quer seja da Aeronáutica ou da Polícia, pois ainda que se descubra que o acidente foi causado por defeito na pista, falha mecânica ou erro do piloto isso não tira o dever de indenizar da companhia aérea.
No máximo, essa apuração dará o direito à companhia aérea de, após indenizar os familiares, se ressarcir do real causador do dano daquilo que gastou. Para que se entenda o significado disso, a lei gera esse tipo de responsabilização porque ela decorre do chamado risco da atividade empresarial. (Ver no site decisões judiciais integrais tratando esse tema)

· A prova
Para evitar dissabores, é importante que os familiares guardem documentos que demonstrem o ocorrido com o parente, tais como reportagens de jornais e revistas, cópia das listas de passageiros publicadas pela companhia aérea, eventual cópia to ticket-passagem (enviado por e-mail) ou cópia do bilhete de passagem (entregue pela agência de turismo) e, claro, o Atestado de Óbito fornecido pelo IML.

· Pensão
Os familiares que são dependentes da pessoa falecida têm direito a uma pensão mensal, que será calculada de acordo com os proventos que ela tinha em vida

· Outros danos materiais
Além da pensão, no cômputo dos danos materiais inclui-se todo tipo de perda relacionada ao evento danoso, tais como despesas com locomoção e alimentação dos familiares que tiveram de cuidar da difícil tarefa de reconhecer o corpo e fazer seu traslado, despesas com o funeral etc.

· Danos morais
Os familiares próximos à vítima podem pleitear indenização pelos danos morais sofridos, que no caso dizem respeito ao sofrimento de que padeceram e das seqüelas psicológicas que o evento gerou. O valor dessa indenização será fixado pelo Juiz no processo. (Ver no site decisões tratando dos critérios normalmente adotados para a fixação desse tipo de indenização).
Anoto que o responsável pelo evento danoso tem o dever de dar toda assistência às famílias das vítimas, inclusive propondo o pagamento de indenizações e pensões. Essa conduta, uma vez realmente adotada, poderá influir numa eventual ação judicial para a fixação da indenização por dano moral. É que, nas variáveis objetivas utilizadas pelo Magistrado para fixar a quantia, uma delas é a do aspecto punitivo.
Na verdade, aquilo que se chama indenização em matéria de dano moral não é propriamente indenização. Para que o leitor entenda bem: indenizar significa tornar indene, vale dizer, encontrar o valor em dinheiro que corresponda à perda material efetiva; fazer retornar, pois, ao “status quo” anterior. Por exemplo, se a pessoa perdeu seu automóvel, basta saber quanto o mesmo valia e fixar a indenização nesse valor. É um elemento de igualdade, portanto.
Vê-se, assim, que a chamada indenização relativa ao dano moral, não é indenização, pois não pretende repor nenhuma perda material ou repor às coisas no estado anterior. É impossível reparar a perda de um ente querido. É por isso que, a indenização por danos morais, como se diz, é satisfativo-punitiva: uma quantia em dinheiro que possa servir de conforto material e ao mesmo tempo punição ao infrator.
Esse aspecto punitivo deve ser reforçado quando o causador do dano age com má-fé, intenção de causar o dano, ou regularmente repete os mesmos erros etc. Por outro lado, o magistrado deve levar em conta a atitude do causador do dano após a ocorrência do evento. Se ele se comportou adequadamente, como acima referi, então, nesse caso, a seu favor haverá uma atenuante para fixar a indenização em menor valor.
Quero realçar esse ponto: se em matéria de serviços de massa, como por exemplo, o transporte coletivo, nenhum empresário está livre de vir a responder por danos causados em acidentes (que na maior parte dos casos, independe de sua ação ou vontade), ele pode, depois do evento, tomar a atitude correta no trato às vítimas e familiares. Essa atitude é desejada e tem um caráter educativo e exemplar, gerando uma minimização do aspecto punitivo da indenização por danos morais.


· Consumidores equiparados
Como aplica-se ao caso o Código de Defesa do Consumidor, é importante lembrar que todas as vítimas do acidente têm os mesmos direitos. Tanto os familiares dos passageiros, como os daqueles que estavam nos prédios atingidos, ou dos pedestres, além dos proprietários dos veículos e imóveis, enfim todos direta ou indiretamente afetados (até os que tiveram os imóveis interditados) são considerados consumidores equiparados e, portanto, têm a proteção da lei.
Cada qual poderá pleitear indenizações correspondentes à suas perdas, tais como pensão alimentícia, indenização por danos morais, indenização por danos materiais por danos causados nos veículos, nos imóveis etc.

· Advogado indispensável
Em qualquer situação litigiosa o advogado é sempre indispensável, mas realço que, no caso em análise é fundamental que os familiares das vítimas e todos os demais que tenham algum direito a ser reparado, sejam acompanhados desde o início de todos os trâmites por um advogado de confiança.

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